4.2.10

Clima. A culpa é do homem. Qual é a dúvida?

Klaus Hasselmann provou a origem humana das alterações climáticas
Entrevista realizada por Enrique Pinto-Coelho, Publicado em 03 de Fevereiro de 2010

Formou-se em Física e Matemática mas é mais conhecido pelos trabalhos sobre as alterações no clima. Acaba de ser premiado em Espanha, pela Fundação BBVA, por "desenvolver métodos que estabeleceram que a actual tendência ao aquecimento global é atribuível, principalmente, à actividade humana", nomeadamente o fingerprinting (impressões climáticas) ou Método Hasselman, utilizado pelo Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) da ONU no seu último relatório.

Como funciona o fingerprinting?
É simples. Funciona do mesmo modo que um polícia quando consegue encontrar uma impressão digital concreta num conjunto de impressões. A meados da década de 1990, concluímos que a probabilidade de explicar o aquecimento observado ao longo dos últimos 30 anos através da variabilidade natural do clima era inferior a 5%.Afirma que "o comportamento humano está a mudar o clima".

Que dados lhe permitem chegar a essa conclusão?
A chave são os dados relativos à superfície terrestre - e não tanto as temperaturas oceânicas - porque são os registos mais antigos que temos. Mas também são importantes os dados sobre as distribuições da temperatura vertical e outros indicadores, como a extensão do gelo no Árctico, o nível do mar, a frequência das tempestades, etc. Contudo, nestes dados adicionais é mais difícil determinar a variabilidade natural dos níveis e demonstrar, com índices elevados de confiança estatística, que as mudanças observadas são de facto induzidas pelo homem.Também diz que "todo o mundo aceita, actualmente, que estamos em perigo porque estamos a mudar o clima".

Mas há legiões de cépticos do aquecimento global que rejeitam essa afirmação. Sente-se capaz de convencer os cépticos sem recorrer a números, só com palavras?
Na comunidade científica, ninguém tem dúvidas sérias sobre a origem humana das alterações climáticas. De facto, ninguém tinha dúvidas mesmo antes de os sinais serem estatisticamente detectáveis, porque os fundamentos físicos subjacentes são convincentes. A maioria dos cépticos age impelida por interesses corporativos e deve ter a mesma consideração que as pretensões iniciais da indústria do tabaco, quando afirmava que os perigos de fumar não são reais.

[O primeiro-ministro britânico] Gordon Brown acertou ao comparar os cépticos climáticos com aqueles que ainda crêem que a Terra é plana. Como se pode convencer estes incrédulos?
Não se pode, mas acabarão por desaparecer gradualmente.

Foi investido doutor honoris causa pela universidade britânica de East Anglia, sede da Climate Research Unit (CRU). Recentemente, vários cientistas de renome da CRU estiveram envolvidos no chamado Climategate. Que opinião tem deste assunto?
É outra mostra dos interesses criados para tentar debilitar a cimeira de Copenhaga com afirmações falsas. Conheço o grupo da CRU há muitos anos. São cientistas sérios e honestos que lidam com problemas difíceis. As pessoas que leram todos os emails da CRU confirmam que não há rasto de desonestidade mas sim muitas discussões sobre a interpretação dos dados, a origem dos possíveis erros, etc., como de facto acontece com qualquer investigação científica complicada. Infelizmente, os media muitas vezes dão uma cobertura entusiástica a estas acções mal-intencionadas porque animam o debate climático, que de outra forma seria aborrecido, com a repetição constante das mesmas conclusões científicas.A NASA acaba de divulgar novos dados sobre o aquecimento global que coincidem, no essencial, com dados prévios publicados pela CRU e outras instituições de topo.

Até que ponto são complementares ou contraditórios os diferentes métodos?
São muito semelhantes e complementam-se uns aos outros. É sempre bom ter vários grupos a olharem para o mesmo problema com ângulos ligeiramente diferentes, porque reforçam as conclusões finais, fornecem informação sobre a origem de alguns problemas e produzem estimativas de incertezas.O IPCC está a preparar um novo relatório . No relatório que está em vigor, de 2007, foram detectados vários erros. Acredita que a próxima versão será melhor?Estou reformado e não participo activamente no Quinto Relatório. Mas estou envolvido na interessante questão das interacções entre as mudanças climáticas e o sistema socioeconómico

. O que devemos fazer para combater as alterações? Tenho defendido, ao longo dos anos, que os cientistas climáticos, os economistas, os cientistas sociais e outros peritos devem envolver-se muito mais com os governantes e aconselhá-los nas políticas climáticas.Garante que as alterações podem ser resolvidas com tecnologia que já existe. Refere- -se apenas às energias renováveis ou contempla também soluções como a engenharia climática?Sim, temos a tecnologia. O problema climático pode ser resolvido com um custo a longo prazo de cerca de 1% do PIB - as estimativas mais pessimistas alertam que pode chegar a 4% do PIB. Em qualquer caso, é um seguro de vida caro mas aceitável para evitar os custos incertos, mas certamente muito maiores, das mudanças climáticas num cenário de inacção. Os custos das alterações climáticas devem ser avaliados do ponto de vista económico, mas também devem contar os efeitos sociais: as pressões migratórias, o aumento do risco de conflitos, o sofrimento dos mais pobres, etc.


in: iol

Sem comentários:

Enviar um comentário